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Entendendo a evolução da Covid-19 com o modelo SIR

O ramo da epidemiologia vem sendo empregado por diversas frentes de pesquisa para auxiliar no entendimento das dinâmicas envolvidas na progressão da pandemia da Covid-19 e no combate a ela.

Neste post, apresentamos a evolução da Covid-19 com auxílio do modelo SIR (suscetível-infectado-recuperado) e elucidamos a importância das medidas implementadas nacional e internacionalmente no combate à pandemia.

Acompanhe!

O que é o modelo SIR?

O modelo SIR é um modelo compartimental. Isto é, contém um ou mais compartimentos que podem interagir entre si. No caso desse modelo epidemiológico, assume-se que cada uma das pessoas de determinada população vive dentro de um dos seguintes compartimentos:

Modelo SIR representado por três elipses horizontais com setas para a direita.
Modelo SIR

Você pode perceber que as iniciais dos compartimentos dão nome ao modelo SIR.

Mas antes de detalhar o que cada compartimento significa, é importante você saber que, para esse modelo básico, é assumido que há N pessoas na população e que essa quantidade permanece fixa o tempo todo.

Ou seja, não existem nascimentos nem mortes nessa população.

Agora sim, vamos aos compartimentos!

As pessoas que estão no compartimento suscetível são aquelas que nunca tiveram a doença infecciosa, mas possuem o risco de contraí-la no futuro de uma pessoa infectada.

Isso nos leva ao segundo compartimento, de infectados. É onde ficam as pessoas que estão com a doença atualmente e podem transmiti-la para as demais.

E o último compartimento é de recuperados, ou seja, pessoas que contraíram a doença uma vez e jamais terão a enfermidade novamente.

Simplificando o modelo SIR com premissas

Antes de continuar, é importante retomarmos o fluxo mostrado no diagrama acima.

Hipoteticamente, se você é suscetível, seu único destino potencial é tornar-se uma pessoa infectada.

Da mesma forma, se você for uma pessoa infectada, o único caminho que você pode seguir é tornar-se alguém recuperado.

E se você for uma pessoa recuperada, não tem mais lugar algum a que você possa ir. Uma vez que você entra nesse último grupo, ficará nele permanentemente.

Com base no que foi dito até agora, você pode estar se perguntando: todas essas premissas são válidas para uma situação real?

Novamente: esse é o modelo epidemiológico básico, portanto várias das premissas assumidas anteriormente não serão totalmente válidas para descrever o seu caso de estudo.

Ou, em outras palavras, existem doenças que, mesmo que você seja uma pessoa recuperada, em algum ponto no futuro, você pode contraí-las novamente.

Além disso, esse  modelo SIR desconsidera outro compartimento englobando pessoas vacinadas, variável que alteraria a dinâmica dos demais compartimentos.

Entendendo o comportamento da doença

Assumindo que ficaram claras as premissas básicas do modelo SIR, vamos entender melhor o comportamento da doença.

O modelo SIR basicamente diz que, conforme o tempo passa, o número de pessoas nos compartimentos muda a partir das interações entre aquelas de diferentes compartimentos.

Para demonstrar isso, vamos utilizar o seguinte exemplo:

4 formas humanas azuis na parte de cima com a legenda "suscetível" e 2 abaixo em vermelho com a legenda "infectado".

Considere uma pequena população de seis pessoas:

  • quatro delas são suscetíveis a contrair a doença.
  • duas estão infectadas.
  • não há recuperados.

Agora, vamos adicionar mais um elemento na equação: as possíveis interações entre essas pessoas e os seus resultados.

Por exemplo, é possível que, em um determinado momento, uma pessoa suscetível interaja com uma pessoa infectada com um aperto de mão ou uma conversa.

No entanto, se uma pessoa suscetível estiver interagindo com outra suscetível, nada vai acontecer. Da mesma forma, se uma pessoa infectada estiver interagindo com outra infectada, nada deve acontecer também.

O ponto é: quando uma pessoa suscetível interage com uma pessoa infectada, não é garantido que a doença passe de uma pessoa para a outra. Entretanto, existe essa possibilidade.

Mais adiante, vamos definir a possibilidade de transmissão através de um parâmetro matemático.

A matemática do modelo SIR

Agora que abordamos os compartimentos, as premissas e o comportamento da doença, vamos partir para a matemática por trás do modelo.

Modelo SIR representado por três elipses horizontais com setas para a direita e suas fórmulas matemáticas abaixo.
A matemática do modelo SIR

O modelo SIR é descrito por meio das equações mostradas na ilustração acima. As derivadas de cada compartimento mostram qual a mudança na quantidade de pessoas pertencentes àquele grupo por um determinado tempo.

Por exemplo, se a taxa de variação do grupo suscetível é um número alto, em termos absolutos, isso quer dizer que o número de pessoas suscetíveis está diminuindo muito rapidamente.

Isso implica um aumento brusco do número de infectados, pois, como citamos anteriormente, é o único caminho permitido no modelo.

Por outro lado, se essa taxa de variação é menor, isso indica uma situação melhor na qual menos pessoas estão se infectando com a doença.

Dito isso, vamos separar os termos presentes nas equações diferenciais do grupo dos suscetíveis e explicá-los separadamente, pois, embora possa parecer complexo, cada um daqueles termos conta um pedaço de uma história.Uma vez que contarmos toda a história, ficará claro o que a taxa de variação do grupo de suscetíveis quer dizer, e isso facilitará o entendimento das demais equações diferenciais.

Grupo de pessoas suscetíveis

Elipse horizontal azul com a palavra "Suscetível (S)" no seu interior e fórmula matemática abaixo.

A divisão

Vamos começar com o termo da divisão do número de infectados I(t) dividido pelo número de indivíduos na população N, que indica a proporção atual de pessoas infectadas.

Utilizando o exemplo anterior, no qual tínhamos uma população com seis pessoas, sendo duas infectadas, esse termo seria igual a 0,33.

Isso quer dizer que, se você atualmente é uma pessoa suscetível a adquirir a doença e, por algum motivo, interagir com uma pessoa aleatória na população durante um determinado intervalo de tempo, existe 33% de chance de que essa pessoa seja do grupo dos infectados.

O termo β

Chamado de taxa de contato, refere-se a quantas interações você teve com outras pessoas durante um intervalo de tempo.

Analisando β junto com o termo anterior, podemos interpretá-lo da seguinte maneira:

  • quantas interações você teve com outras pessoas da população.
  • qual a probabilidade de essas outras pessoas estarem infectadas.

O termo τ

Chamado de probabilidade de transmissão, é uma medida que analisa a chance de uma pessoa infectada transmitir a doença para alguém suscetível a partir de uma interação.

Um τ grande, por exemplo, diz que essa interação tem maior chance de resultar em que você fique doente.

Tudo o que discutimos até agora serve para uma pessoa, certo?

Mas e se pensarmos na população total?

Para isso, vamos multiplicar por S(t), que é o número de pessoas suscetíveis em um determinado tempo. Com isso, você vai saber a mudança total no número de pessoas desse grupo nessa população.

O sinal negativo

Para entendermos o sinal negativo no início da equação, olhamos para o termo S(t) e analisamos que ele pode apenas diminuir com o tempo, pois, como vimos no diagrama anteriormente, o único caminho para pessoas suscetíveis é tornar-se uma pessoa infectada, e não temos fluxo algum de pessoas entrando no grupo de suscetíveis.

Dessa forma, aquele sinal negativo mostra que a taxa de variação do número de pessoas no grupo de suscetíveis é sempre negativa.

Essa primeira equação era a mais difícil, mas agora, sabendo a história desses termos, fica mais fácil entender as demais equações diferenciais.

Grupo de pessoas recuperadas

Elipse horizontal verde com a palavra "Recuperado (R)" no seu interior e fórmula matemática abaixo.


Agora, vamos analisar a equação diferencial que rege o número de pessoas recuperadas.

A derivada de R(t), com relação ao tempo, mostra que a taxa de variação do grupo de recuperados vai ser igual a um parâmetro γ (taxa de recuperação) multiplicado pelo número atual de pessoas infectadas.

Dessa forma, para termos um alto número de recuperados, precisamos de um alto número de infectados ou uma alta taxa de recuperação.

Grupo de pessoas infectadas

Elipse horizontal vermelha com a palavra "Infectado (I)" no seu interior e fórmula matemática abaixo.

Dito isso, fica mais fácil analisar a taxa de variação do grupo de infectados, visto que, no início da modelagem, assumimos que o número de indivíduos nessa população é constante o tempo todo.

Isso mostra que, se somarmos a taxa de variação de cada um dos grupos, o resultado dessa soma tem que ser igual a zero.

Assim, descobrimos que a taxa de variação do grupo de infectados em um determinado intervalo de tempo é dada pela diferença da taxa de variação do grupo de suscetíveis menos a taxa de variação do grupo de recuperados.

Analisando o comportamento das curvas

Agora podemos analisar o comportamento desses grupos em um gráfico e discutir termos que temos ouvido muito na mídia recentemente, como achatamento da curva e o número básico de reprodução (𝕽).


sir-model2

Analisando o gráfico, você pode perceber que, no eixo vertical, temos o número de indivíduos em um determinado tempo e, no eixo horizontal, a dimensão de tempo.

No início, temos uma pessoa infectada e nenhuma pessoa recuperada. Com o passar do tempo, a doença começa a se espalhar pela população e, com uma defasagem de acordo com o tempo de recuperação, temos um aumento no número de recuperados.

Com isso, podemos fazer uma análise importante com a equação diferencial do grupo dos infectados. Existe um momento no tempo, no qual essa curva de infectados vai alcançar o seu máximo, ou seja, a taxa de variação desse grupo será zero. Esse ponto será definido quando:

Fórmula matemática do modelo SIR.

O que estamos assistindo bastante na mídia recentemente é o foco na curva de infectados. Mas por que é importante prestar atenção ao comportamento dessa curva? E como podemos achatá-la?

Como você já deve ter escutado, uma doença altamente contagiosa, como a Covid-19, tende a aumentar o número de pessoas no grupo de infectados muito rapidamente, sobrecarregando o sistema de saúde.

É nesse ponto que entramos na discussão sobre o achatamento da curva do grupo de infectados, para que se tenha o controle no número de pessoas infectadas sem sobrecarregar o sistema de saúde.

sir-model

Agora que entendemos o comportamento desses grupos com a ajuda do gráfico, precisamos nos perguntar: de que maneira efetiva podemos achatar essa curva e discutir o impacto dessas atitudes com o auxílio do modelo SIR?

Para isso, vamos analisar um parâmetro muito importante na modelagem de doenças infecciosas: o número básico de reprodução (𝕽). Ele diz o quão problemática é uma doença para uma população.

Em outras palavras, podemos analisá-lo como o número médio de pessoas que serão contaminadas por uma pessoa infectada antes de ela entrar para o grupo dos recuperados. Como calculamos isso?

Calculando o número básico de reprodução

Para calcular esse número, vamos utilizar o inverso do parâmetro β. Podemos analisá-lo como o tempo médio entre interações. Por exemplo, digamos que, a cada 2 dias, temos interação com uma pessoa diferente da população.

Da mesma forma, vamos utilizar o inverso do parâmetro γ e analisá-lo como sendo o tempo médio de recuperação.

Vamos supor que esse tempo seja de 10 dias, então, se você contraísse a doença agora, levaria 10 dias para estar recuperado.

Se analisarmos como esses parâmetros interagem entre si, podemos pensar da seguinte maneira: você tem uma doença e vai levar 10 dias para se recuperar dela, e a cada 2 dias você interage com alguém da sua população. Isso quer dizer que acontecem, em média, cinco interações (dez dividido por dois) nas quais você ativamente pode transmitir a doença para outra pessoa.

Vale lembrar que isso não quer dizer que a outra pessoa vai contrair a doença, pois temos o parâmetro τ (probabilidade de transmissão) que trata da probabilidade de uma pessoa suscetível contrair a doença, caso ocorra essa interação.

Agora, vamos juntar tudo isso e definir o Número Básico de Reprodução (𝕽) em termos do modelo SIR:


Assim, para conseguirmos achatar a curva de infectados, precisamos diminuir o número básico de reprodução. Temos três opções:

  • diminuir β;
  • diminuir τ;
  • aumentar γ.

Sendo assim, para entender o que isso quer dizer nas ações atualmente utilizadas na pandemia da Covid-19, vamos analisar um exemplo para cada parâmetro.

  • Diminuir o parâmetro β implica reduzir o número de interações entre as pessoas, ou seja, o isolamento social e o fechamento de lugares públicos.
  • Diminuir o parâmetro τ implica reduzir a probabilidade da transmissão da doença, ou seja, caso ocorram as interações entre as pessoas, como reduzir a probabilidade de contágio? Sugere-se o uso de máscaras e de álcool em gel para isso.
  • Aumentar γ implica diminuir o tempo de recuperação dos infectados, ou seja, aplicar o tratamento adequado.

Conclusão

Esta foi uma explicação básica com o objetivo de retratar a evolução da Covid-19 com auxílio do modelo SIR.

De fato, esse modelo epidêmico é eficaz e explica o comportamento das curvas de forma objetiva. Além disso, ele elucida a importância das medidas implementadas nacional e internacionalmente no combate à pandemia da Covid-19.

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  • Eduardo Lisboa
    Por Eduardo Lisboa Analytics Engineer at IndiciumTech

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